O encarecimento da dívida externa africana

Nas últimas semanas, 13 das 15 eurobonds africanas registaram um aumento significativo nas suas yields. Este movimento trava os planos de novos financiamentos por parte de vários países africanos, incluindo Angola. O motivo é simples: está a tornar-se cada vez mais caro recorrer ao crédito internacional, sobretudo em moeda estrangeira.

O que são eurobonds?

Os eurobonds são títulos de dívida emitidos por Estados ou empresas em moeda estrangeira (normalmente dólares). Ao comprá-los, investidores internacionais emprestam dinheiro ao país emissor do título, que promete pagar juros regulares e reembolsar o valor total num determinado prazo.
Angola, como muitos outros países africanos, recorre a este instrumento para financiar défices orçamentais ou grandes investimentos públicos. No entanto, esta opção traz riscos significativos, principalmente quando o pagamento da dívida depende da geração de receitas em moeda forte.

O significado da subida dos yields, desmitificado

O yield de um título de dívida indica o juro efectivo que o Estado paga. Quanto mais alto esse valor, maior o risco percebido pelos investidores — e maior o custo de novo endividamento. Em Abril, os títulos angolanos chegaram a ultrapassar os 14% de yield. Isto significa que, caso o Estado queira emitir nova dívida agora, terá de prometer juros altíssimos, pressionando ainda mais as contas públicas.

Por que acontece?

Este aumento nos yields está ligado a vários factores combinados:
  • Níveis elevados de endividamento público em vários países africanos;
  • Aumento das taxas de juro internacionais, sobretudo nos EUA, que faz os investidores exigirem mais retorno em mercados de maior risco;
  • Incerteza económica global, marcada por tensões geopolíticas e inflação persistente;
  • Dependência de commodities, como o petróleo, que continuam a expor países como Angola a volatilidades externas.
No caso angolano, a queda recente nas receitas petrolíferas e as fragilidades estruturais do modelo económico agravam a percepção de risco.

Evitar nova dívida: uma decisão sensata

Neste contexto, muitos países têm evitado novas emissões de eurobonds. Angola, por exemplo, mantém-se em modo de observação. A ministra das Finanças, Vera Daves, já indicou que o Estado só avançará com nova emissão se as condições de mercado forem favoráveis.
Trata-se de uma postura prudente e acertada. Emitir dívida em condições adversas comprometeria a sustentabilidade financeira do país e colocaria ainda mais pressão sobre as gerações futuras.

Pessoalmente, apoio esta abordagem. Ainda que mantenha algumas reservas em relação a certas premissas de Dead Aid, de Dambisa Moyo, partilho a sua crítica principal: a dependência de financiamento externo fragiliza a autonomia dos países africanos.

Continuar a empurrar o problema da dívida para a frente, com juros crescentes e prazos apertados, não é uma solução. A resposta está em casa: fortalecer a capacidade fiscal, diversificar a economia e apostar na boa gestão. Endividar-se menos não é só sensato — é também uma afirmação de soberania.

Estamos por nós

Este momento revela mais uma vez o que muitos já sabem, mas poucos enfrentam: o desenvolvimento sustentável não virá da dívida externa, nem da boa vontade dos mercados. Virá de dentro. É urgente consolidar caminhos próprios de crescimento, que reduzam a vulnerabilidade e aumentem a capacidade real de investimento.
A escolha de evitar nova dívida a qualquer custo é, neste cenário, um passo na direcção certa.

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